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Dois Mundos

Nem todas as realidades são verdadeiras.

· vida,pressa,tempo,gentileza,ouvir

De dentro do elevador, vi que ele vinha andando, parecendo cansado naquele nível em que as pessoas já não levantam mais os olhos. As portas do elevador começaram a se fechar, e eu apertei o botão para abri-las novamente. Ele levantou o rosto; uma expressão de grande surpresa no olhar. Apressou o passo, e quando entrou no elevador, me olhou com uma expressão mista de surpresa e agradecimento.

- Oi, tudo bem? - perguntou

- Tudo ótimo - respondi.

- Muito obrigado! - disse ele, com uma entonação de agradecimento verdadeiro.

- Imagina, não por isso. - respondi.

Ele encostou na parede do elevador, ergueu a cabeça naquele gesto típico de “retirar o peso dos ombros”, de olhos quase fechados deu um suspiro de puro alívio.

- Até que enfim tô em casa - disse ele.

- Que bom! - respondi

Nos dois andares que subimos, numa fração de tempo; passou pela minha mente o significado de tudo que eu estava vendo nele. O resultado de um dia que deve ter sido um verdadeiro “massacre”. O elevador parou no meu andar, as portas se abriram, ele olhou novamente para mim e disse:

- Boa noite, e mais uma vez, muito obrigado!

- Não por isso, tenha um bom descanso! - respondi.

Enquanto virava a chave na minha porta, imaginei que tipo de mundo este homem habita. Talvez no mundo dele seja um espanto que alguém o olhe. Mais ainda, que alguém o veja. Um mundo onde é impossível esperar; e portanto, um assombro que alguém pare (PARE!) as portas para esperar por ele. Um mundo onde as pessoas provavelmente não se cumprimentam; não se olham; não querem saber umas das outras, porque deve ser um mundo onde tudo que importa é resolver os problemas; trabalhar desesperadamente numa pressa incessante, cumprir os prazos impossíveis, todos eles, todos os dias. Um mundo onde o ato mais simples e banal de gentileza causa assombro suficiente para receber agradecimento DUAS vezes (com MUITO obrigado) em menos de dez segundos.

Enquanto abria minha porta, agradeci, profundamente, por habitar outro mundo.

No mundo que habito, as pessoas, suas existências e suas necessidades, vem primeiro. Vivo cercado de pessoas gentis. Educadas. Que se importam. No mundo em que vivo, as pessoas que me cercam cotidianamente me olham nos olhos, assim como eu olho nos delas. Elas falam comigo com atenção, e com verdade. Nem sempre elas (nem eu) estão felizes, é claro. Elas (e eu) temos problemas. Mas isso não nos transforma em seres indiferentes um ao outro. No mundo em que eu vivo, compromisso, resultado e trabalho são importantes. Mas não são motivo (nem desculpa) para destratar; ignorar ou não ouvir o desabafos ou as necessidades de quem vive ao nosso lado. Porque o mundo em que eu vivo, é dedicado aos seres que nele habitam. As coisas, os bens; os resultados; tudo isso vem DEPOIS dos seres - porque tudo isso foi CRIADO para SERVIR ao bem estar DOS SERES.

Entrei em casa, e imediatamente sentei para escrever este texto. Para compartilhar com os dois mundos: o meu (ao qual sou infinitamente grato) e o dele (o qual conheço, porque eu já estive lá); que AMBOS os mundo são REAIS, AMBOS os mundos ocupam espaços entremeados. Mas UM deles é VERDADEIRO, porque é fundado nos seres, na existência, na consciência, na escuta, no Amor. O outro, fundado em coisas, pressa; desespero, dor e inconsciência; esse é REAL, mas é FALSO. E para compartilhar que é possível, sim, sair do FALSO e mudar-se para o VERDADEIRO. Mas exige atitudes e escolhas. Talvez a primeira delas seja olhar. E depois, ver. E Ouvir. E aceitar. E abraçar. E compreender. E acolher. E então, um dia; de repente, você se dá conta que mudou de mundo, para um mais verdadeiro, onde à sua volta, se sabe AMAR.

Gratidão. Infinita Gratidão.

Paulo R. R. Ferreira

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